Desde pequena que dizia que o meu maior sonho era ser feliz.
Lembro-me de alguns momentos, quando era criança, onde falava com Deus numa prece desesperada: «eu só quero ser feliz.»
Soluçava de tanto chorar e vivia coberta de medo. Pois eu já tinha sido exposta a uma vida que todo o ser humano considera ser dura e injusta para qualquer criança. E, de todas as formas, eu queria que a dureza da vida se apartasse de mim.
Genuinamente, o meu único desejo era ser feliz.
Já na idade adulta, recordo-me de várias conversas que cheguei a ter com uma amiga em que disse que, embora ainda fosse jovem, sentia que já tinha vivido uma vida inteira.
Eu estava cansada. Sobrecarregada.
Se tiveres a oportunidade de conversar com qualquer pessoa que me conheça, a primeira coisa que te vão dizer é: «ela dá com cada gargalhada…».
Essa é uma das características que Deus me deu - da qual já tive muita vergonha por ser mandada calar pelas pessoas.
Eu gosto de rir, gosto de soltar uma boa gargalhada.
Porém, trazia comigo uma grande confusão. Como era possível eu chorar tanto e desejar ser feliz sendo que, quando eu ria era com vontade?
Cheguei a sentir-me hipócrita, uma autêntica impostora que apenas desejava atenção. Porque se a minha vida era tão marcada de episódios tristes, então eu teria que ser triste até ao fim dos meus dias.
Até que mais tarde, num processo em que fui colocada frente a frente com os traumas do passado, eu entendi que isso era uma grande mentira. E que a vida é composto por diferentes estações.
Como assim, Ana?
Para mim, há a consciência de que a vida não é uma linha reta. Comparo-a a uma caminhada entre vales e montanhas, pois o caminho que percorremos tem altos e baixos. Seja porque o mundo é como é, seja por causa das acções de outros ou por causa das nossas decisões.
A vida é tão vasta que tem espaço para os momentos de dor e para os de pura alegria, onde dá a sensação que andando pelo deserto, de repente avistamos o oásis.
É tão complexa que podemos chorar quando não temos do que nos queixar e sorrir quando tudo já desabou.
Penso que tudo parte do posicionamento que tomamos. Das mentiras que decidimos abandonar. Mas, principalmente, a quem confiamos a nossa vida.
Já não é novidade para ninguém que a minha vida e tudo o que ela engloba não pertence a mim, mas a Cristo. Isto pode causar um nó na cabeça de alguns, mas eu vivo com a consciência de que tudo o que vivo aqui é passageiro - fora o facto que só Nele encontro a verdade.
À medida que fui deixando Deus tratar os meus episódios dolorosos eu pude perceber que, ainda que estivesse a sentir a pior dor, eu podia ter a verdadeira alegria. A tristeza podia ser deixada, pois eu não tinha de levar esse fardo pesado até ao fim da minha vida.
A dor faz tanto parte da vida quanto a alegria. O que é certo é que nada dura para sempre. Então, sou consciente que os momentos de felicidade podem ir e vir… mas, o mesmo acontece com a dor. E eu escolho não ficar presa a ela.
Onde quero chegar com isto tudo é: a alegria não é um sentimento.
Creio que um dos grandes problemas do ser humano é deixar-se guiar unicamente pelas suas emoções - por vezes, temos dificuldade em exercer controlo sobre elas.
Até chegamos a olhar para Deus como alguém que não se importa ou que está sempre em modo de castigar só porque lhe apetece, só por causa do desgoverno das nossas emoções.
No seu livro “Santo, Santo, Santo”, Jackie Hill Perry diz que “... tudo o que é desprovido de alegria e endurecido não descreve Deus.”
Concordo com ela!
Temos uma tremenda dificuldade em pensar que Deus é alegre. Assim como cometemos o erro de pensar que lhe passa ao lado a nossa dor.
Quando comecei a aprofundar-me mais no carácter de Deus, eu fui percebendo que Ele é alegre. Tanto que ao ler Gálatas capítulo 5, onde descreve o fruto do Espírito, a alegria está lá. Porém Ele não ignora a minha dor.
Então, não… a alegria não é um mero sentimento, mas um fruto do Espírito. Os frutos não pedem à árvore que faça força para que nasçam, a natureza fará com que eles sejam produzidos.
Por isso, a alegria pode ser produzida diante das noites mais escuras e não apenas nos momentos felizes. E nada tem a ver com abafar o choro ou viver de acordo com uma positividade tóxica.
Para mim, a alegria é a convicção de quem Deus é e da estabilidade que Ele nos dá, mesmo quando a vida não é linear e as circunstâncias balançam as nossas estruturas.
Todos os episódios que vivemos têm o seu tempo de duração. Eles não permanecem para sempre. Mesmo que fiquem na nossa memória, podem ser ressignificados. E podemos escolher ultrapassá-los.
Nós também não permanecemos os mesmos. Nós somos alterados - resta saber se para bem ou para mal, tudo vai depender de como vamos nos posicionar mediante as situações.
O único que permanece o mesmo é Aquele que Tiago, irmão de Jesus, dizia: “Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação.” - Tiago 1:17
Talvez possas achar que falo sem fundamento, mas, ao crescer sem pai, nascer numa casa onde o meu avô era violento e abusivo, e ter perdido a minha mãe aos 12 anos… acredita, o que me mantém de pé é saber que Deus me amparou em todos os momentos, quando eu não tinha estrutura alguma.
Sei o que é sofrer e ver os que amo sofrerem, sei o que é perder quem amo, sei o que é ser rejeitada sem nunca ter feito nada para merecê-lo.
Mas hoje, após lidar de frente com a dor, sei o que é ser amada com um amor incondicional que, apesar dos momentos mais dolorosos, sempre ergueu a minha cabeça e ainda me deu como característica a Sua alegria.
Mas, Ana… és feliz?
Sou. Mas, não da forma como este mundo considera a felicidade. E por muito tempo eu não me considerava feliz porque pensava como este mundo carregado de futilidades e falsas conquistas nos obriga a pensar.
Sou feliz porque apesar da perda, violência e rejeição, tenho vida e continuo a ter a oportunidade de ser curada e, ao olhar à minha volta, saber que não estou sozinha. Tenho pessoas que amo e que me amam.
Poderia estar numa situação bem mais difícil, mas eu tenho uma vida boa porque Deus fez com que tudo cooperasse para o meu bem - “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.” (Romanos 8:28).
Hoje tenho a oportunidade de não perpetuar as más decisões de quem veio antes de mim e de ver Deus a escrever uma nova história numa família que muitos já deram por acabada.
Não tenho uma vida perfeita, mas Aquele que me aperfeiçoa em amor tem-me a mim com o que tenho de bom e de mau e não se escandaliza com o que vê. Pelo contrário, investe para que haja crescimento e mudança.
Ele não me deve nada, mas dá-me tudo o que preciso - em qualquer área da minha vida. Mas, o mais importante de tudo: dá-me a Sua alegria, que se tornou a minha força para enfrentar qualquer dia mau. Ao não me esquecer de quem Ele é.
Que texto maravilhoso! Parabéns por escreves sobre coisas que te afligem, demonstra muita força e coragem ❤️